Nas calçadas de Barcelona.

Segundas e quartas geralmente são iguais, pois nesse dois dias da semana as minhas atividades se repetem. Levanto às 7h, dou uma aula de Yôga às 8h, tomo café às 9h30, enquanto assisto uma série no tablet sobre a mesa, ou vídeos do Youtube, que aliás, vejo muitos. Por volta das 10h30 ou 11h, sento em minha mesa de trabalho para avançar em alguma coisa que foi interrompida na noite anterior quando eu fui vencido pelo cansaço, e lá fico até chegar o momento de sair para ir ao supermercado.


Passando pela porta de saída, giro a direita, caminho poucos passos e giro outra vez a direita. Ando toda a quadra para girar mais uma vez a direita e desviando as pessoas que andam devagar ou estão paradas conversando na estreita calçada, chego na rua larga, movimentada onde geralmente tenho que esperar o sinal abrir, pois quase nunca chego e pego o sinal já aberto para atravessar, mas lá a calçada é larga.

Atravesso a rua e sigo reto por mais uma quadra com calçada estreita. Tenho que reduzir o ritmo dos passos para esperar uma oportunidade de ultrapassar o vovôzinho ou a vovózinha que anda lentamente pelo meio da calçada. Chego na esquina, giro a esquerda, desço uma rua que inclina, é quase um bumerangue, e chego em outra rua larga e movimentada. Ao cruzar essa rua, chego na calçada e giro a direita, onde depois de alguns passos entro a esquerda no supermercado, na verdade a entrada é de uma galeria, o mercado é mais para dentro.

Bom, depois refaço todo esse trajeto ao contrário, ou quase todo, porque costumo voltar por uma quadra abaixo do caminho que fiz de ida. Por ela chego naquela rua larga onde sempre tenho que esperar o sinal abrir para cruzar, e no caminho de volta não é diferente. Fico na esquina esperando o sinal ficar verde para pedestres, enquanto observo discretamente uma senhora que vive na rua, na esquina. Quando ela chegou era tão bem arrumada, acho até que cheirava talco. Suas cobertas eram limpas, sua roupa também, e o cabelo super bem penteado.

Com o tempo as roupas foram ficando com cara de mal cuidadas, o cabelo agora parece sujo, ou seja, ela não tem acesso a banheiro para tomar banho regularmente. E confesso que o banho era a única coisa que eu me questionava, como ela fazia, onde ia? Até que um dia passando por lá, ela estava fazendo cocô. Siiiiimmm, cocô, na rua, enquanto um monte de gente passava de um lado para o outro. Eu nem cheguei a imaginar que ela defecava.

Claro, temos necessidade de fazer mais cocô e xixi, ao dia, do que tomar banho.

Aparentemente culta, e aposentada, imagino que ela tenha dinheiro para as suas necessidades, como comprar comida, bebida e tomar café no bar ao lado da minha escola, sem precisar pedir. Porque eu nunca a vejo pedindo.

Na quarentena devido o Covid19, ela teve a rua toda só para ela, ou as ruas. Não usou máscara e talvez nunca tenha sido multada por isso, ou simplesmente por estar na rua. Mas ela não tem banheiro para fazer cocô, foda-se o banho, cocô é mais importante. Agora vou olhar diferente para cada pessoa que vive na rua, pois além de não ter onde fazer as necessidades fisiológicas, como é que ela lava as mãos? E não me refiro ao banho, é lavar as mãos mesmo, depois de fazer cocô.

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