História de um fã da Xuxa e das Paquitas

O que será narrado aqui são fragmentos das minhas memórias vistas da minha perspectiva. Tenha em mente que esses acontecimentos ocorreram há mais de 30 anos, em outra época, com infinitamente menos possibilidades do que as que existem hoje.

Introdução

Para colocar o leitor em perspectiva, preciso contar um pouco sobre quem eu era e o que me rodeava naquele momento. Filho mais velho de dois irmãos, nascido em uma família católica de trabalhadores, nunca nos faltou nada, mas também nunca houve sobras. Comecei a trabalhar aos 14 anos com meu pai, aprendendo o ofício da refrigeração, enquanto estudava eletrônica em uma escola técnica. Isso me permitiu bancar meus próprios gostos desde muito jovem. Também participei de grupos da igreja do meu bairro entre os 14 e os 17 anos, o que me permitiu socializar bastante em um ambiente cristão e descobrir outros tipos de famílias, observando suas próprias e peculiares interações. Aprendi que vinha de um mundo muito pequeno e que havia um universo interminável por trás de cada porta, em cada casa, em cada pessoa.

Aos 17 anos, já havia me apaixonado profundamente e sofrido com a perda desse amor, o que me levou à música hard rock e heavy metal — cabelo comprido, couro, tachas — o clássico estereótipo dos anos 80. O que acabou sendo estranho, porque com os valores que havia aprendido e para onde havia direcionado minhas preferências, era como um metaleiro pacifista, um Gandhi de cabelo comprido. Quem não me conhecia atravessava a rua para não passar perto de mim, mas isso nem era ruim naquela época, porque eu só queria ficar tranquilo.

Aos 18 anos, quis novamente me relacionar e podemos dizer que ela foi meu segundo amor — até ficamos noivos, com anel de prata e tudo. Aos 19 anos, comprei um ciclomotor de 50 cc, comecei a estudar na universidade, e aos 20, já tinham me roubado o ciclomotor, eu havia abandonado os estudos e comecei a trabalhar muito. Comprei então uma moto de fabricação local de 200 cc. Socialmente, havia crescido muito, já que o pequeno círculo da igreja e do colégio se expandiu para colegas da faculdade, amigos de amigos, etc.

 O Prelúdio

O verão de 1990–1991 era o cenário quando tudo começou. Naquele momento, não sei por que uma ideia simples surgiu na minha cabeça: eu queria ir ao mar. Havia três opções: o litoral atlântico do meu país, o Chile e o Brasil. Das três, a única que tinha água quente era o Brasil. Eu me lembrava de ter ido quando criança a Mar del Plata e também lembrava que não gostei da água fria. O Chile era igual, então, por eliminação, o destino escolhido foi o Brasil.

Naquela época, eu já namorava a Graciela há quase três anos. Então, planejei a viagem para duas pessoas, juntei o dinheiro e me informei o máximo que pude — lembre-se de que não havia internet em 1990. Quando falei com Graciela sobre ir de férias ao Brasil, ela disse que não queria ir, mas que eu podia ir, sem problema.

E assim foi que, em abril de 1991, com 21 anos, parti rumo a Torres, no Rio Grande do Sul, Brasil. Gostei do mar, das pessoas daquele lugar, do clima, mas algo aconteceu naquela cidade que ficou em mim e começou a me transformar. Para economizar, eu costumava comprar comida para viagem num lugar local. Enquanto esperava prepararem a refeição, havia uma TV ligada.

Nessa tela, vi pela primeira vez o Xou da Xuxa — na verdade, trechos, durante a espera. Eu não entendia nada do que se dizia, mas havia algo ali. Nunca soube explicar o que vi, o que me atraiu de forma irresistível (hoje, 32 anos depois, eu tenho essa resposta). Comecei a perguntar o que era aquilo que via na TV, e as duas filhas do casal que cozinhava me contaram sobre o programa, quem era quem, mostraram fotos e endereços importantes no Rio de Janeiro, etc. Elas eram fãs, mas nunca tinham conseguido ir.

As férias acabaram e voltei para a Argentina. Aqui, pela TV, fiquei sabendo que aquela loira chamada Xuxa começaria a apresentar o show no meu país. Comecei a assistir, e a semente plantada na minha cabeça lá em Torres começou a germinar. Antes de sair de férias, eu havia comprado um carro, a versão latino-americana do General Lee, o Dodge Charger, que aqui se chamava Dodge GTX. Ele já estava sendo restaurado junto com meu amigo Marcelo.

Junto com ele, assistíamos todas as tardes ao Xou da Xuxa. Fomos entendendo e ouvindo sobre esse mundo — um programa para crianças, mas que, de alguma forma, tocava nossos corações. Aos poucos, fui — ou fomos — nos interessando mais por uma ou outra Paquita. Era algo absolutamente visual; não conhecíamos nada sobre aquelas pessoas, nem mesmo sobre a Xuxa. Minha primeira opção foi a Flavia, mas posso confessar que não me envolvia porque preciso conhecer a pessoa para sentir algo completo, então era apenas uma brincadeira diante da TV. Marcelo escolheu Ana Paula Almeida e nunca mudou sua escolha.

 A Primeira Viagem ao Rio

Começamos juntos a traçar o primeiro plano: quando o carro estivesse pronto, iríamos ao Rio de Janeiro para conhecer aquele mundo que víamos pela TV. Decidimos não ir a Buenos Aires, mesmo sendo mais perto. Particularmente, não gosto daquela cidade, além de termos observado que nem sempre todas as Paquitas estavam na Argentina. Já no Rio, sim. O carro foi pintado de vermelho e a data escolhida foi outubro.

Quando contei meus planos à minha namorada, ela simplesmente foi embora. Restaram apenas alguns bilhetes, três fotos e um anel de prata de noivado. Como vivíamos (e vivemos) na Argentina, havia peças que não conseguimos encontrar para o carro. Outubro se aproximava e não havia como terminar o carro a tempo. Meu amigo também não teve permissão do pai para ir (em 1990, era preciso ter 21 anos ou permissão dos pais para sair do país). Tudo parecia dar errado.

Chegou outubro e tomei uma decisão naquele cruzamento da vida: iria de moto até o Rio de Janeiro e enfrentaria tudo sozinho para alcançar aquele mundo, aquela dimensão. Contra chuva, vento, distância, cansaço, desconhecimento e a barreira do idioma, parti no dia 12 de outubro de 1991.

Olhando para trás, devo admitir que foi uma loucura — mil coisas poderiam ter dado errado. Não sei por que eu tinha a letra de Luna de Cristal gravada em mim, que funcionava como farol, guia e proteção, como se fosse uma profecia. E eu cheguei lá.

Me vi, de repente, na esquina do Teatro Fênix, no Jardim Botânico. Não podia entrar, não tinha ingresso, e me diziam — pelo pouco que consegui entender — que todos os ingressos estavam esgotados até o fim do ano. Sentado na calçada, lamentando minha má sorte, pensando no que fazer, vi Oswald Berry, o coreógrafo, atravessar a rua. Lembrei que ele era uruguaio. Esperei ele voltar e fui falar com ele. Expliquei quem eu era e o que fazia ali. Ele me pediu que esperasse junto a uma portinha por onde entrou.

Passaram 20 ou 30 minutos e ele voltou. Me deixou entrar. Já na arquibancada, junto a muitas outras pessoas, finalmente pude assistir à gravação de um Xou por dentro. Se não me engano, foi em 16 ou 17 de outubro. Eu não tinha uma boa câmera, então as poucas fotos que tirei estão muito distantes ou são bem ruins.

Mas naquela arquibancada, três coisas aconteceram:

Tirei minha primeira foto de uma Paquita de perto — atenção, "de", e não "com". Sem saber, havia estado conversando com a mãe da Ana Paula Almeida, e num intervalo ela veio e aproveitei a oportunidade.

Senti-me feliz naquela dimensão de sons, luzes e cores — de alguma forma, eu havia conseguido o que tinha me proposto meses antes.

Conheci uma garota na arquibancada. Nivia era o nome dela. Conversamos bastante, sobretudo porque mal conseguíamos nos entender.

 Com o coração cheio, com a meta cumprida, saí da gravação. Já do lado de fora, Nivia me perguntou o que eu ia fazer, e eu disse que procuraria um posto de gasolina para dormir — como vinha fazendo durante toda a viagem. Ela arregalou os olhos e disse:

“Você não pode dormir na rua, vão te assaltar ou coisa pior!”

E me levou para sua casa, a da sua mãe, na Tijuca. Lá passei alguns dias. Me levaram para conhecer praias, me ensinaram linhas de ônibus, metrô e, o mais importante, comecei a entender o idioma.

Iniciei o retorno ao meu país. A viagem foi igualmente difícil, mas sem contratempos, até o Rio Grande do Sul. No meio do caminho, entre Osório e Porto Alegre, o pistão da moto se furou e, como não havia peças de reposição, tive que deixá-la em uma loja onde prometeram cuidar dela.

O retorno terminou de ônibus, e na minha cabeça já giravam ideias de como e quando voltar para buscar minha moto. Mas mais importante do que isso era como voltar ao Rio e levar meu amigo comigo. Ele não podia perder outra chance — ele precisava ver com seus próprios olhos aquele mundo.

A segunda viagem ao Rio

Retomando a história de onde parei da última vez, como já disse, era necessário fazer outra viagem para recuperar minha moto que havia ficado lá. Mas, na verdade, isso não me afligia, tampouco me preocupava tanto — encarei como a desculpa perfeita para poder voltar em pouco tempo. Não foi difícil convencer o pai do meu amigo Marcelo a deixá-lo viajar comigo. Eles eram de uma família de mecânicos de automóveis, então, usando a quebra da moto como desculpa, foi fácil conseguir a permissão. Também não foi difícil comprar as peças de reposição nem juntar o dinheiro para a viagem — eram outros tempos.

Com tudo pronto, fizemos a viagem de ônibus, primeiro de Córdoba a Uruguaiana e depois de Uruguaiana ao Rio. Quarenta e oito horas dentro de um ônibus. Marcelo dormiu a viagem inteira; eu, que não consigo dormir em movimento, li vários livros. O plano da viagem era simples: ficaríamos na casa da Nivia, em Tijuca, e voltaríamos a falar com Oswald Berry para que nos deixassem entrar nas gravações. E assim foi.

Para mim, foi uma conquista incrível ter conseguido fazer duas viagens ao Rio de Janeiro em menos de três meses. Eu ainda não entendia o que me motivava a ir àquelas gravações, minha cabeça estava cheia de perguntas, mas sem respostas. Eu apenas seguia o impulso, seguia meu coração e minha intuição.

Cabe aqui esclarecer que isso não pretende ser uma história completa nem cheia de detalhes, já que não é um livro — apenas uma estrutura, um esqueleto de uma experiência vivida há mais de meia vida. Como antecipo, houve seis viagens ao Rio e muitas conclusões, ramificações e pensamentos de cunho filosófico e profundo... mas não vamos nos adiantar.

E então chegou o dia 4 de dezembro de 1991. Aquele dia foi cheio de acontecimentos, e para mim, representou um antes e depois. Como já expliquei, procuramos Berry para nos deixar entrar, e assim ele fez. Acredito ter manifestado minha eterna gratidão a ele em alguma ocasião posterior, pois sem esse elo na cadeia, nada teria sido possível.

O que veio a seguir foi parecido com outubro: fotos de má qualidade, o rosto de Marcelo radiante de alegria subindo e descendo nas arquibancadas, olhando tudo incrédulo. E, para nossa sorte, a gravação envolvia as Paquitas cantando uma música inteira — parecia que nada poderia ter sido melhor. Mas teve mais.

Quando a gravação terminou e estávamos indo embora com todos os outros, uma garota na arquibancada nos abordou falando espanhol. Seu nome era María, de Buenos Aires, Argentina. Ela se apresentou, nós também, e nos perguntou por que estávamos indo embora. Dissemos que a gravação havia acabado. Ela nos contou que haveria mais gravações e que, por sermos estrangeiros, poderíamos ficar em quantas quiséssemos. E assim fizemos, mesmo com um certo sentimento de culpa, esperando a qualquer momento sermos expulsos por algum segurança. Mas isso nunca aconteceu.

María nos contou que era fã, que seguia Xuxa em Buenos Aires e que estava ali buscando mais proximidade. Em um dos intervalos, me perguntou se eu já havia tirado foto com alguma Paquita ou com a Xuxa. Contei minhas experiências e disse que não. Ela então perguntou com qual Paquita eu gostaria de tirar uma foto e, sem hesitar, respondi: Flávia. Em certo momento, quando Flávia passou perto, María a chamou e pediu uma foto comigo — e assim ficou imortalizado aquele momento do espaço-tempo de 32 anos atrás.

Tive aquela sensação que muitas vezes ocorre em nossas vidas em momentos de muita felicidade: “Pronto, posso morrer em paz.” Mas a vida, generosa, sempre nos dá mais, nunca para, pois guarda para nós muito mais do que podemos imaginar ou desejar.

Mencionei Graciela na primeira parte da história, e há dois motivos para isso. Esse dia é um deles: conheci Graciela em 4 de dezembro de 1988 — exatamente quatro anos antes. É estranho... algo estava acontecendo ali. Havia sinais, números e indícios por toda parte.

Depois desse dia, fortalecemos mais nossas amizades, tanto com os locais quanto com os novos amigos. Sempre fiquei pensando na estranheza de conhecer alguém do seu país longe do seu país. Tenho uma foto daqueles dias: Marcelo dormindo na calçada da Barra da Tijuca ao lado de María, em plena luz do dia. Um exemplo claro de como os tempos mudaram — hoje, se fizessem o mesmo, talvez acabassem presos.

Quando o dinheiro acabou, descemos para o Rio Grande do Sul para consertar a moto e continuar nosso retorno em duas rodas rumo à querida Córdoba, na Argentina. Basta mencionar que pegamos chuva, dormimos em banheiros públicos e até numa vala de oficina. Passamos frio, calor e fomos devorados por mosquitos. Ao chegar a Córdoba, tínhamos no bolso apenas 2 pesos — o equivalente hoje a 1 real —, mas com o coração cheio e a mente fervilhando de planos para voltar.

Os planos para uma terceira viagem ao Rio incluíam a possibilidade de passar por Buenos Aires e de lá seguir para o Rio, ou ir direto quando recomeçassem as gravações em 1992 e nos encontrarmos lá com María. Duas ideias nos seduziam ainda mais: o aniversário de 15 anos de Ana Paula Almeida em fevereiro (os 15 anos para as mulheres e os 18 para os homens são muito importantes na Argentina), mas não sabíamos se valia a pena ir só para isso, já que normalmente não havia gravações no início de fevereiro. E o de Flávia Fernandes, que faria 16 anos em março. Mas nada disso aconteceu.

Tivemos que esperar. Por um lado, não sabíamos quando começariam as gravações no Brasil e, por outro, fiquei doente com hepatite em janeiro de 1992. Fiquei 40 dias em repouso. Durante esse período, aprendi a pintar em tecido e fiz as camisetas que usaríamos depois. Nada extravagante — uma camiseta vermelha que na frente dizia "Anjos da Xuxa" e nas costas "Córdoba".

Viagem a Buenos Aires

O que acabou acontecendo foi que entre março e abril de 1992 fomos a Buenos Aires no Dodge GTX. Ficamos na casa de María e acompanhamos os fãs e as Paquitas em cada chegada e saída do hotel, do show e do aeroporto.

Tive sorte nessa viagem — Marcelo, nem tanto. As Paquitas que encontramos não eram sempre as mesmas, com exceção da Catú. Nessa viagem estavam: Flávia, Juliana e Roberta. Lembre-se de que meu amigo era apaixonado por Ana Paula Almeida.

Também estivemos com o Roberto (Dengue) e com Berry (nosso querido coreógrafo que abria portas). Nessa ocasião, entreguei à Flávia um presente: meu anel de compromisso de prata, o mesmo que tive com Graciela, e uma carta da qual não me lembro do conteúdo exato. Provavelmente explicava a história do anel e que ele não representava um “compromisso” nesse sentido, mas sim um símbolo de que minha fidelidade e carinho sempre a acompanhariam.

Apesar de termos ido às gravações, eu não entrei — apenas acompanhei as idas e vindas. No segundo dia de gravação, de longe, Flávia me viu, levantou a mão e tocou um anel com o polegar — presumo que fosse o meu — como quem diz: “Olha, estou usando.” Pode imaginar, querido leitor, que essa foi a segunda vez que senti que poderia morrer em paz, que tudo estava realizado... mas sempre há mais.

Recordações que guardo muito dentro de mim, que não espero que ela nem ninguém mais guarde — ainda mais depois de tanto tempo —, mas que me trazem alegria toda vez que os evoco. Sem querer, associei essa pequena pessoa, em dois momentos, a duas coisas importantes que marcaram minha vida: a data da primeira foto e contato com ela, e o anel de compromisso — com tudo o que simbolizava da primeira vez e também da segunda.

O retorno dessa aventura foi bem esquecível: o Dodge quebrou e o deixamos em Rosario, voltando de trem até Córdoba. Mas fizemos planos com María de nos encontrarmos em junho no Rio — Catú faria 19 anos em julho, e esse aniversário nós faríamos questão de comemorar.

A TERCEIRA VIAGEM AO RIO

Sim, com letras maiúsculas, essa foi, tanto pela duração quanto pelas experiências, a viagem mais memorável de todas.

Por volta de meados de junho embarcamos para o Rio com meu amigo Marcelo, fomos de ônibus, mais uma vez aquela viagem eterna de 48 horas, mas com muita ilusão pelo que significava o destino que nos arrastava até aquelas latitudes. Este capítulo também poderia se chamar “o efeito Pituxita”.

Ao chegar, nos hospedamos em um hotel que já havíamos conhecido no dezembro anterior, o Ferreira Viana no Flamengo. Considerei a localização estratégica para todos os deslocamentos que fazíamos e também considerei as vantagens com o transporte público que usávamos para tudo, além dos custos, já que era mais barato do que Copacabana ou Leblon.

Nos encontramos com Maria, ela estava hospedada na casa de uma garota do Rio com quem tinha feito amizade por causa do Xou da Xuxa, ou seja, também fã. Era um pouco da história que nós já tínhamos vivido em 1991, mas eu considerei que precisava me tornar independente para ter mais liberdade de horários e movimentos, por isso não fomos para a casa da Nívia como na viagem anterior. Além disso, tudo estava calculado para uns 15 dias: tentaríamos surpreender Leticia em seu aniversário e, depois do aniversário da Catú, no dia 5/7, voltaríamos.

Preciso esclarecer aqui uma grande diferença de manifestações de personalidade que existe no meu país entre as pessoas do interior e as que vivem em Buenos Aires. As pessoas do interior, como nós, são mais introvertidas, mais quietas, manifestam menos o que sentem. O “porteño” é muito mais extrovertido, fala alto e não tem problema em tentar passar por uma porta mesmo que não deva, se do outro lado está o que ele busca, ele vai mesmo assim. Diria que são menos respeitosos com o que está estabelecido.

O fato é que Maria já havia conversado com a segurança da entrada no Teatro Fênix e podíamos entrar sem problemas, não era preciso recorrer ao Berry nem a ninguém mais — só por termos vindo de tão longe nos deixavam passar. Meu português também havia melhorado muito desde minha primeira viagem em abril de 91. Então, acessar as gravações era só ir, haha, enquanto Maria estivesse por lá. Notamos que era mais fácil entrar se você fosse mulher do que homem.

Como o querido leitor já deve ter notado, não falei de mais do que uma pequena parte das pessoas que compunham aquele mundo. Por um lado, para não embolar muito a história, por outro lado, porque cada personagem terá sua parte neste relato no momento certo.

A primeira coisa que notamos foi que o cenário havia mudado — não era o mesmo de 1991 — nem os Paquitos estavam recebendo a Xuxa quando ela descia da nave ou a acompanhando. Mas comecemos por Leticia Spiller, ou Pituxa Pastel. Quando disse que não conseguia decidir, naqueles jogos em frente à TV antes da minha primeira viagem, por alguma Paquita em especial — mas que me inclinava mais por Flávia — era porque Leticia também era, para mim, uma menina bonita, com aqueles grandes olhos claros, e mais próxima da minha idade. Sua voz também me agradava muito, não sei por quê. Tenho um certo ouvido, e não era A Voz, mas talvez as letras, as harmonias, algo me tocava.

Imagine descobrir que ela não era mais Paquita... Isso me doeu, me pegou de jeito. E pensei: “E agora, como vou conhecê-la?”, “Como vou dizer que vim para o aniversário dela?”. Foi um choque maior do que o cenário novo ou a ausência dos Paquitos.

Pelo menos ela havia sido substituída como líder por Ana Paula Guimarães, a Catú, que sempre teve boa disposição com os fãs — como alguém disse por aí, “a Paquita mais amável”, e de fato foi.

Mas voltemos àquela primeira gravação à qual assistimos com Maria e meu amigo Marcelo em junho de 1992. Estávamos na primeira fila, Maria à minha esquerda, Marcelo à minha direita. Mais cedo havíamos cumprimentado o Roberto Dengue desde esse mesmo lugar, quando Xuxa desceu da nave. E, no intervalo da gravação, Maria me perguntou se eu conhecia a Xuxa. Eu disse que sim, claro, que por isso tudo tinha começado. Mas ela perguntou se eu conhecia de verdade, de cumprimentar, dar um beijo, não pela TV, revista ou à distância. Respondi que obviamente não. E ela me disse que sim, que ela conhecia. E que a Xuxa também a conhecia.

Lembrei do quanto os “porteños” costumam ser fanfarrões e ri dela. Então ela disse: “Quer conhecer ela?”. “Sim, claro”, respondi sem acreditar. E começou a chamá-la aos gritos: “Xuxa, Xuxa, Xuxa!”. Quando Xuxa a viu, sorriu e a cumprimentou com a mão. E Maria insistiu: “Vem, Xuxa! Vem, loira!”. E, contra todas as minhas previsões... Xuxa veio.

Xuxa cumprimentou a Maria, e ela disse: “Quero te apresentar dois amigos, são Marcelo e Adrián, de Córdoba, Argentina”. Ela deu a mão para Marcelo, e depois para mim, e me perguntou, sem soltar a minha mão:

“De onde é Córdoba?” E eu, me afogando naqueles olhos azuis, cara a cara com a perfeição encarnada e envolto numa aura que nunca mais senti, comecei a responder: “Córdoba está a uns 3.000 km daqui, no centro da Argentina. Esta é minha terceira viagem ao Rio para assistir às suas gravações, vim em outubro de moto e participei de uma única gravação graças ao Berry, depois voltei em dezembro porque quando estava voltando a minha moto quebrou em Rio Grande do Sul e voltei com Marcelo para buscá-la…” e continuei falando.

E ela continuava segurando minha mão e me olhando fixamente nos olhos, mas de tudo o que eu dizia, ela ficou com uma coisa só, e perguntou: “De moto?”, eu parei e disse: “Sim”. Ela completou: “3.000 quilômetros?”, “Sim”, respondi. E a Rainha decretou: “Desce”, disse com firmeza, mas suavemente.

Toquei meu queixo com a mão livre como quem alisa a barba e disse: “Mas eu tenho 22 anos”, como quem diz “sou velho, lá é só para crianças”. Ela insistiu: “Não importa, desce”. E lá fomos nós três. A própria Xuxa havia aberto as portas do seu reino. Deixávamos de ser seguidores para nos tornarmos convidados.

A quarta viagem ao Rio

Houve momentos lindos e muito bons nesta viagem, mas preciso começar antes, com os preparativos — isso por causa do motivo da viagem. Meus amigos nessa aventura, María e Marcelo, não puderam estar comigo, então, como no ano anterior, eu iria e estaria sozinho lá, naquela grande cidade. Curiosamente — e olhando em retrospectiva — acho que essa e a quinta viagem teriam sido as melhores para o meu amigo Marcelo. Acho que, se ele tivesse feito essas duas viagens, algo teria mudado na sua história, e com certeza isso teria impactado a minha também. Mas as coisas são como são, ou melhor dizendo, as coisas são como devem ser.

O que se pode dar de presente para uma Paquita em seu aniversário de 17 anos? Certamente, devido à minha condição financeira, não poderia ser algo caro. Algo que ela ainda não tivesse? Também não a conhecia tanto a ponto de saber o que ela queria e o que não tinha — e talvez, mesmo que soubesse, eu não conseguiria dar. Fiquei quebrando a cabeça durante dias. Até que decidi não pensar no “o quê”, mas sim em um significado, em um simbolismo. Pedi ajuda a amigos, conhecidos e parentes para reunir tudo o que precisava, tive que aprender cerâmica queimada com uma amiga, mas no fim o presente ficou pronto.

Como Marcelo não participou dessa viagem, prometi a ele que daria algo especial de presente de aniversário, mesmo ele não estando lá comigo. E parti — desta vez, de avião.

Sem María e com o movimento de argentinos nas gravações diminuindo, me vi novamente tendo que pensar em como entrar nas gravações do Xou. Embora os seguranças ainda se lembrassem de mim, ainda era um pouco desconfortável tentar passar por uma porta sem um convite. Mas não houve problemas — a tempestade Pituxita veio resolver isso.

Na viagem anterior, eu havia conseguido todos os endereços e telefones das meninas — algumas me deram diretamente, outras foram as mães, como no caso de Priscilla e Cátia. Então, devido à proximidade que Ana Paula demonstrou na viagem anterior, liguei para ela e combinamos que eu iria à casa dela, em Vista Alegre, e de lá a mãe dela nos levaria para as gravações — e assim foi feito.

As gravações que acompanhei nesta viagem foram mais tranquilas. O motivo é simples: quando não se conhece, há medo, ansiedade ou tensão sobre o que pode acontecer. Mas como eu já estava entendendo os mecanismos e como tudo funcionava, essa foi a viagem mais relaxada e talvez a mais aproveitada — sem tantas surpresas. Minha única preocupação no início era como entregar o presente de aniversário para Bianca — encontrar o momento certo. Eu nunca tinha conseguido ir até a casa dela, então teria que ser durante as gravações.

Isso era um problema duplo: por um lado, aquelas meninas nunca tinham tempo livre, e quando tinham, era no camarim — fora do meu alcance. Por outro lado, o presente precisava ser explicado, devido à sua natureza, e isso exigia tempo e atenção. Tomei a decisão de entregar enquanto se gravava a parte em que uma atração se apresentava no Xou — nesses momentos, algumas Paquitas seguravam as crianças e outras agitavam bandeiras na plateia.

Pedi para Bianca ficar com as bandeiras, e eu me coloquei atrás dela. Já havia dito que aquele era seu presente de aniversário e que precisava explicar. Ela aceitou. Quando o momento certo chegou, comecei a falar próximo ao ouvido dela, pois o volume durante aquela parte da gravação era alto. Comecei a descrição pela parte externa: o objeto era um baú, como os de tesouro. Por fora, parecia feito de madeira envelhecida, com duas tiras de couro prendendo a tampa. Mas por dentro, era completamente dourado, o que dava a impressão de que brilhava ao ser aberto. Era feito de cerâmica e cozido em forno.

Dentro, havia vários elementos: no fundo do baú, havia granito azul, cuja única jazida na Argentina ficava perto da minha cidade, na minha província — algo único que me representava. Um pedaço de quartzo transparente, trazido da cordilheira ao oeste — representava algo único do oeste. Um frasquinho com terra do Cerro de los Siete Colores, de Jujuy — representava o norte. E outro frasquinho com água, que em algum momento foi gelo de geleira do sul — representava o sul.

Também havia pétalas de rosa — representando o tempo. O baú, o presente, era um lembrete: era como qualquer pessoa — não importa a aparência externa, o que importa está por dentro. Todos temos o potencial de sermos um tesouro. O granito azul era algo único de uma região, que sempre estaria ali com sua forma particular de ser. As pétalas de rosa representavam o tempo: hoje belas e perfumadas, um dia iriam murchar, mas continuariam sendo pétalas de rosa — o importante é Ser, não apenas permanecer.

Os outros três elementos eram coisas únicas de três pontos cardeais. Ela, Bianca, era o componente único e, do meu ponto de vista geográfico, representava o leste — assim, o mapa do tesouro se completava com aquele presente.

Nunca soube ao certo se ela entendeu. Na hora me pareceu que sim, mas ela é uma excelente atriz, então nunca vou saber.

Tendo cumprido o principal motivo da viagem, restava o segundo: cumprir minha promessa a Marcelo. A ideia era um tanto estranha, como a do baú. Felizmente, eu tinha contato frequente com a Pituxita. O objetivo era aproximar meu amigo de sua agora distante Ana Paula no próprio aniversário dele.

Primeiro, combinei com ela: pedi que, em determinado horário da noite, olhasse para a lua por um minuto. Disse que esse seria o presente que ela daria ao meu amigo em seu aniversário — só isso, não precisava fazer mais nada. Vale mencionar que ela me perguntou por Marcelo quando nos vimos pela primeira vez nessa viagem, e por que ele não tinha vindo. A lua seria o ponto de encontro — ao menos, de olhares à distância.

Liguei para Marcelo, considerando a diferença de fuso horário, expliquei o que aconteceria, pedi também que olhasse a lua em um horário determinado e disse: “Ela vai estar olhando para a lua nesse horário e pensando em você por um minuto”. Depois confirmei com os dois, e ambos disseram que cumpriram o combinado. Fazer o quê? No fundo, bem no fundo, sou um romântico.

Deixo aqui algumas observações: uma é sobre por que me refiro à Pituxita — Ana Paula Martins de Almeida — como “tempestade”, “furacão” ou “efeito Pituxita”: porque não se negocia com uma tempestade — ela simplesmente passa por cima, arrasando tudo, e deixa aquela sensação de que algo te aconteceu. Você não sabe bem o quê, nem por quê, mas aquilo te revolucionou.

Lembre que estou falando de coisas que aconteceram com pessoas jovens, em um contexto muito específico, num tempo muito específico. Depois veio a vida adulta, com suas boas e más decisões.

Outra coisa que refleti ao longo das décadas é: o que me atraía naquele mundo, naquelas gravações? Era algo físico? Uma atração? Algo platônico? Uma idealização? Não, não era nada disso. Eu também não era fã — fã perdoa tudo, aceita tudo, é incondicional. Eu não era assim.

A melhor analogia que encontro é o que muitas pessoas sentem ao sair de férias — sentem que se desconectam da realidade, se recarregam de alguma forma. Era isso que eu sentia. E essa mudança que ocorria em mim é o que realmente gerou esse sentimento de gratidão que carrego até hoje.

Isso no geral. No particular, eu admirava o quão longe aquelas pessoas tão jovens tinham chegado, obviamente graças ao empenho e esforço delas. Esse reconhecimento se transformava em uma vontade de estar perto, o mais perto possível, para ver e aprender.

Vale esclarecer também que tudo que escrevo é a minha visão dos fatos — é como eu lembro das coisas, e não necessariamente como outro testemunho as lembraria. Duas pessoas podem observar o mesmo e depois relatar de forma diferente. Cada um vê com seus próprios olhos — influenciado por muitos fatores distintos.

Nessa viagem também tive muitos contatos fora desse mundo (de Xuxa e Paquitas), com pessoas comuns — mas nem por isso menos maravilhosas. Veja, caro leitor: de tanto tirar fotos e levá-las para revelar, acabei fazendo amizade com as moças da loja de revelação. Dora era o nome de uma delas, Carla era a outra.

Dora me levou para passear em lugares que eu ainda não conhecia, mesmo já tendo ido três vezes ao Rio. Um exemplo: o Cristo Redentor. Ela também tentou me ensinar a dançar lambada numa noite que saímos — mas não teve jeito, eu não nasci para a dança. Acho que Carla sentia algo por mim, mas infelizmente minha cabeça não estava em modo "romance" naqueles tempos. Vai saber o que poderia ter acontecido…

Também lembro dos jantares, almoços e passeios com outras pessoas do Rio — entre elas, as primas da Ana Paula Almeida: Renata, Carminha e muitos outros. Esse parágrafo é só para ilustrar que nem tudo girava em torno de Xuxa ou Paquitas — talvez tenha começado por isso, mas me permitiu conhecer gente excelente com quem vivi bons momentos.

Essa viagem foi, das que fiz até então ao Rio, a mais parecida com férias normais, com passeios, visitas e o bônus do "Reino da Xuxa". Mas não podia terminar sem outra promessa: Pituxita já sabia, naquele momento, que eu havia tentado estar no aniversário da Letícia naquele ano, que estive no da Catú, que fui ao da Bianca e que tentei, sem sucesso, estar no da Flávia em março — e só consegui vê-la de passagem em Buenos Aires, pois ela teve que viajar, mas não foi bem no dia.

Elas sempre sabiam quando eu voltava para a Argentina — eu as avisava, me despedindo. E Ana Paula sabia mais ainda — era ela quem me pegava pela mão para entrar no Teatro Fênix e evitar problemas na entrada.

Então ela me pediu:

“Você vem no meu aniversário, né?”

E eu não podia dizer que não.

Respondi: “Claro que vou vir.”

E ela completou:

“Traga o Marcelo.”

E assim, com essa promessa, ficou selada minha próxima viagem.

Em dezembro de 1992, Xuxa e sua turma vieram à minha cidade para fazer seu Xou. Não podíamos faltar a isso, eu e meu amigo Marcelo — ele já tinha se recusado a ir em outubro, e eu ainda não sabia que ele se recusaria novamente em janeiro de 93. Mas como estavam vindo aqui, era diferente, ele não podia dizer não.

Não veio ninguém conhecido de Buenos Aires — eu achei que viriam, mas não foi assim. Então, para receber as Paquitas no aeroporto, só estávamos eu e Marcelo. Como éramos apenas nós dois, não precisávamos de um carro para fazer a caravana de um único veículo. Eu já tinha reconstruído a moto que usamos um ano antes para voltar do Brasil, então a perseguição foi de moto. As Paquitas subiram numa caminhonete branca no aeroporto e nós as seguimos até o hotel no centro da cidade. A única que abriu a janela durante a maior parte do trajeto foi Ana Paula Almeida. Eu estava dirigindo, então foi o Marcelo quem tirou várias fotos tremidas, hahaha. Ficou claro que os fãs só estavam ali por Xuxa, e não pela sua turma — isso nos surpreendeu um pouco, a mim e ao Marcelo, mas nos permitiu curtir como fãs tranquilamente, então, por esse lado, foi até melhor.

Xuxa visitou um dos hospitais infantis da minha cidade, e nós estávamos lá. Lá sim havia uma multidão e imprensa, e foi quase impossível se aproximar dela. Mas, mesmo assim, estivemos presentes.

Depois veio a vigília no hotel até a saída rumo ao Estádio Córdoba — era assim que se chamava na época, hoje é o Estádio Mario Alberto Kempes. E claro que acompanhamos o ônibus que levou a turma até o estádio.

Ali, na porta do hotel, aconteceu algo que lembro com clareza e que me pareceu estranho, mas gratificante. Uma vez que já estavam no ônibus e nós tentávamos acenar através das janelas, Catú, Ana Paula Guimarães, me viu. Escreveu algo na mão e mostrou pelo vidro, mas eu não consegui ler. Então ela procurou um papel, escreveu algo e tentou passar pela janela, mas estava muito alto para eu alcançar. Então ela fez sinal para que eu fosse até a porta, e assim eu fiz. Não queriam me deixar passar, mas conseguimos dar um jeito para que ela me entregasse aquele papelzinho. Nele havia um número e duas palavras: “Me chama”.

Por alguns minutos, fiquei parado na calçada. Para mim, aquilo foi um reconhecimento muito grande. Nós tínhamos nos visto pela primeira vez em Buenos Aires no começo do ano, depois passamos todo um mês juntos em meados do ano no Rio, depois novamente em outubro, e agora aqui. Não sei e nunca saberei o porquê, mas penso que o fato de termos viajado até a minha cidade deu a ela a noção da distância que a Xuxa já havia percebido de imediato um ano antes, e ela reconheceu os sacrifícios que fizemos para estarmos perto delas durante tanto tempo naquele ano. Ela, que sempre foi muito reservada com sua vida pessoal — apesar de algumas coisas que nos contou sob a chuva de inverno, quando nos despedimos no Rio, em julho — nunca tinha nos dado seu endereço, muito menos seu número de telefone. E nós sempre respeitamos isso. De repente, agora, eu tinha o número dela. Foi um gesto realmente bonito, que guardei para sempre no meu coração.

Depois veio o Xou no estádio, e não conseguimos nos despedir delas, por dois motivos: primeiro, nunca soubemos o horário exato da partida; segundo, no dia seguinte era preciso trabalhar. Era necessário juntar dinheiro para a próxima viagem — e como meu trabalho era com refrigeração, dezembro sempre foi um mês de muito trabalho.

A Quinta Viagem ao Rio

Ou, como eu costumo chamar, o começo do fim desta aventura. Vamos recapitular um pouco: quando essa viagem terminou, já fazia vinte e dois meses desde a minha primeira ida ao Brasil e dezesseis meses desde a minha primeira vez no Rio. Comecei com 21 anos e agora tinha 23. Meu amigo Marcelo havia me acompanhado em duas dessas viagens, mas não me acompanharia nesta também, por mais que eu insistisse, por mais que eu dissesse que a Pituxita havia me pedido para levá-lo. Ele se recusou. Como Marcelo tomou essa decisão, voltei a viajar de avião — não estava com vontade de passar quatro dias, ida e volta, de ônibus sozinho.

Maria, de Buenos Aires, estaria presente nesse aniversário, assim como outras pessoas de lá também. Uma eu já conhecia de outubro, Nancy era o nome dela, e também estavam umas gêmeas que eu só conhecia de vista — fãs de Buenos Aires, fotógrafas e seguidoras da Xuxa, que segundo me disseram, eram bem reconhecidas pela Loira (como era chamada lá). Elas ficariam na casa de amigas no Rio e eu, como sempre, no Flamengo, no hotel Ferreira Viana.

Nesta viagem não haveria gravações (era final de janeiro, começo de fevereiro), então eu ia apenas para o aniversário de Ana Paula Almeida, seus 16 anos. Nos encontramos com o pessoal de Buenos Aires antes do aniversário e também visitei alguns amigos no Rio. Mas, no geral, foram dias solitários. Às vezes eu vagava pelas praias, outras vezes pelas ruas, mas sempre sozinho, como se fosse um fantasma. Não tentei encontrar ninguém mais ligado à Xuxa. Por um lado, sentia que incomodaria — afinal, estavam de férias, curtindo um descanso muito merecido — e não quis atrapalhar isso. Lentamente eu começava a perceber algo que, ao voltar à Argentina, se colocaria em movimento dentro de mim, preparando o sexto e último retorno ao Rio de Janeiro.

Tentei lembrar o que levei de presente de aniversário para Ana Paula, mas isso desapareceu da minha memória — simplesmente não lembro. Minha lembrança começa com ela abrindo o portão de sua casa na Av. das Américas, na Barra. Lembro que me cumprimentou muito feliz por me ver, e a segunda coisa que fez foi perguntar: “E o Marcelo?” Dei uma desculpa qualquer por ele... Ah, como eu queria que ele tivesse vindo comigo, pensava eu. Vale dizer que a comemoração não aconteceu no dia exato do aniversário dela, mas uns 5 ou 7 dias depois. Imagino que, no dia mesmo, ela tenha passado com a família ou amigos mais íntimos.

A “festa” estava cheia de parentes, muitas primas. Lembro bem da mãe dela — sempre sorridente e feliz com aquela homenagem feita à filha. Também estava lá a Luzía, irmã do casamento, e muitos “porteños” (argentinos da capital), o que para meu gosto já era demais — com Maria, Nancy e as gêmeas, minha cota já estava cheia. Mas suponho que todos tínhamos o mesmo direito de estar ali. O lugar tinha muitas árvores, muito verde e sombra, algo muito bem-vindo com o calor que fazia. Foi uma celebração normal, sem nada fora do comum para um aniversário, embora sim, algumas coisinhas aconteceram.

Alguém pediu que ela fizesse uma sessão de fotos — acho que foi uma das fotógrafas — e Ana Paula aceitou. Aproveitei e tirei algumas fotos também. Outra coisa curiosa que me aconteceu com ela foi que me trouxe uma cerveja. Em um momento, ela se aproximou de mim com duas latinhas nas mãos e perguntou: “Bebe cerveja?” Eu a olhei desconfiado... Pensava que todas as Paquitas seguiam o mandamento da Xuxa de "nada de bebida, nada de drogas", e tudo mais. Eu não bebo com frequência, mas em ocasiões especiais, sem problema. Então pensei: “Dane-se o mandamento da Xuxa, essa é uma ocasião especial... Quantos humanos já receberam uma cerveja de uma Paquita?” E respondi: “Sim, eu bebo.” Ela me deu uma lata e levou a outra para um outro rapaz que estava por lá — talvez um cunhado, sei lá.

Coloque-se, leitor, no tempo certo dessa experiência que acabo de relatar. Não estou falando dessas meninas já maduras, casadas ou com filhos — falo de meninas menores de idade que, com seu trabalho, construíam o mundo imaginário da Xuxa, da qual eram as maiores fãs. Por isso, achei curioso que Ana Paula tenha sido minha fornecedora de cerveja naquela tarde.

E assim a tarde prosseguiu até o sol se pôr. Cantaram parabéns, fizeram pedidos, jogaram ela para o alto, tiraram mais fotos... E, ao final, a festa acabou. Nos despedimos felizes por ter compartilhado essa data especial com ela. Eu, particularmente, estava no auge da realização de um desejo que tinha começado olhando para uma tela de TV um ano e meio antes. Dei os dois beijinhos com que se costuma cumprimentar no Rio, sem saber que seriam os últimos dois beijos que daria nela ou em qualquer Paquita. Curiosamente, a Paquita da qual tirei minha primeira foto naquela plateia, em outubro de 1991.

Todas as viagens ao Rio tiveram seus bônus, suas surpresas inesperadas, algo fora do planejado. E esta não seria diferente.

Saímos da casa de Ana Paula e começamos a caminhar. Tínhamos que ir até a Av. Lúcio Costa pegar o ônibus para voltar para casa. Estávamos andando pela atual Av. Ayrton Senna, e uma das meninas — a anfitriã das porteñas — disse: “O Paquito Alexandre mora aqui, querem ver se ele está?” Todas disseram: “Siiiiim, vamos!” E eu fui junto com a maioria.

O rapaz estava lá e nos recebeu muito bem-humorado. Conversamos um pouco, ele lamentou não ter nada para oferecer, pois o pegamos de surpresa. Tiramos fotos com ele — acho que foi a primeira vez que fãs argentinos da Xuxa o procuraram em sua casa, e acho que ele gostou disso. Ele tinha praticamente a minha idade, uns dois anos a menos, talvez. Já li coisas sobre orgulho e arrogância a seu respeito... mas eu sempre olho nos olhos das pessoas e enxergo além da superfície. Às vezes tenho medo do que vejo, mas nele não vi nada de ruim. Talvez porque pude ver sua essência — no que ele se tornaria. Talvez tenha visto que ele ainda não estava formado, só distraído e no caminho errado.

Sei que, nos anos 2000, ele mudou de vida e virou missionário na África, no país mais pobre do mundo. Talvez fama e fortuna não fossem para ele. Talvez ele tenha entendido o que é realmente importante para um homem. Acho curioso que o único Paquito com quem cruzei na vida tenha escolhido justamente esse caminho. Longe dos holofotes, da atenção pública, do glamour e da comodidade. Um grande recado para quem acha que é aí que está a felicidade e a realização.

Depois desse encontro curioso e inesperado, cada um voltou para sua casa ou hotel... e depois, todos de volta à Argentina.

A sexta viagem ao Rio

Essa aventura que estava começando, depois da quinta viagem ao Rio, como um simples pensamento em minha mente, eu não suspeitava que se transformaria numa aventura que duraria a vida toda. Foi assim que fevereiro de 1993 me encontrou, cheio de reflexões, sentado uma noite em frente à minha casa. Pensava e repassava em minha mente todas as coisas que tinham acontecido nos últimos vinte e dois meses. E uma ideia ia tomando conta da minha cabeça: eu precisava tomar uma grande decisão. Eu não sabia por quê, não entendia por quê, e acho que ainda não entendo. Pelo menos, as respostas que consigo vislumbrar não são lógicas nem claras.

Havia duas opções diante de mim naquele momento. Uma era me mudar para o Brasil e começar minha vida lá, tentando permanecer perto do que eu tinha vivido e experimentado naquele quase um ano e meio — já que, se eu fosse, pensava apenas no Rio como destino. A outra opção era ficar na Argentina, buscar uma companheira e começar uma família. Eu não podia tomar os dois caminhos. Não era compatível, na minha visão, formar uma família viajando três vezes por ano ao Rio.

Alguns leitores provavelmente discordarão de mim, e eu entendo, pois realmente havia muitos outros cenários possíveis. E seguramente seja assim, mas para outras pessoas, que são diferentes de mim. Veja, caro leitor, eu sempre soube o que ia fazer. Nunca pude ver todo o caminho desde o começo, mas à medida que fui envelhecendo, fui sabendo qual era o próximo passo. Não sei explicar, simplesmente é assim.

Por exemplo, aos 12 anos eu soube que seria técnico. Não sabia em quê, mas sabia que meus estudos e meu trabalho seriam de natureza técnica. Aos 14, soube que trabalharia ao lado do meu pai até o fim da vida profissional dele. Aos 16, soube que faria uma grande viagem de moto — não sabia que seria ao Rio especificamente, mas sabia.

Tudo isso dá margem para análises profundas e filosóficas, e todos os pontos de vista são válidos, pois, como seres humanos diferentes, pensamos diferente. Mas é algo que eu cobro das gerações atuais, e principalmente dos meus filhos: não se preocupam em se conhecer e saber o que realmente desejam e quais ações tomar para que seus sonhos se realizem. Do meu ponto de vista, isso os faz perder muito tempo, que é a única coisa realmente valiosa que temos.

Desculpe compartilhar todos esses pensamentos aqui, mas quero mostrar a luta que tomou conta da minha mente naqueles tempos. Eu não queria continuar indo e voltando ao Brasil. Ou eu me estabelecia lá, ou ficava aqui. Minha decisão se complicava pelas coisas que eu tinha vivido no Rio. Não tinham sido apenas férias com sol, mar e praia — foi algo mais profundo, da alma.

Se eu tivesse que definir Xuxa, por exemplo, eu diria que ela é uma manifestação de energia gigantesca e corporificada, que aconteceu naquele momento do espaço-tempo com tamanha magnitude e intensidade que prendeu centenas de milhares, talvez milhões de pessoas em seu campo gravitacional. Podemos debater se Xuxa isso ou aquilo, mas é inegável o efeito que teve em gerações de pessoas. Me considero afortunado por ter estado ali, no que considero seu máximo esplendor, e por ter sido convidado por ela mesma a participar de seu imaginário.

Demorei um tempo, mas no fim decidi ficar na Argentina. E devo esclarecer: até que eu fosse capaz de escolher, não tive paz. Assim que tomei a decisão, tudo foi clareza, tranquilidade e calma. Com isso começava outra busca: com quem eu queria compartilhar o resto da minha vida? A única coisa de que eu tinha certeza era que ainda não a conhecia.

Foi assim que chegou o dia 8 de maio, a primeira vez que saí com Vilma. Uma garota que conheci no meu ambiente de trabalho e com quem já estava conversando havia algumas semanas. E naquela noite eu tomei a decisão: ela era a garota. E, com um excesso de sinceridade, eu contei isso a ela. Ela achou que eu estava louco, delirando. Propus uma demonstração para mostrar que estava falando sério. Eu tinha vendido minha moto — a com a qual viajei ao Rio, a mesma que tivemos que consertar com Marcelo numa floresta no Rio Grande do Sul para poder voltar. Propus comprar com esse dinheiro as primeiras coisas para nossa futura casa e mandá-las para a casa dela, para que ela guardasse. Depois íamos juntando mais coisas e, quando ela quisesse, a gente se casava.

Essa história é grande demais para ser contada aqui, mas em poucos meses já tínhamos decidido: casaríamos em 18 de novembro no civil, dia 19 na igreja, com festa na mesma noite, e no dia 20 — aniversário dela — voaríamos em lua de mel para o Rio de Janeiro.

Assim se concretizou minha sexta viagem ao Rio de Janeiro e o começo do resto da minha vida. Ficamos lá algumas semanas. Fomos aos pontos turísticos normais, mostrei a ela alguns lugares por onde minha história com Marcelo tinha passado. E voltamos de lá com quem seria minha primeira filha, Ana Paula Juliana.

Não visitei ninguém, nem famoso nem desconhecido, no Rio de Janeiro. Éramos só minha esposa e eu em lua de mel. Mas com tantas idas e vindas das Paquitas pelo mundo para gravações, as cruzamos no aeroporto no dia em que fomos carimbar os bilhetes de volta. Não posso garantir quem estava lá, Catú com certeza, mas não sei quais eram as outras. Minha esposa Vilma me disse: “Vai, cumprimenta elas.” E eu não quis. Demos meia-volta e fomos embora.

Depois que voltamos, aconteceu a maior parte da minha vida — já se passaram trinta anos. No fim de agosto de 1994 nasceu Ana Paula Juliana, quinze meses depois, em novembro de 1995, nasceu Gabriel Alejandro. Quinze meses depois, em janeiro de 1997, nasceu Leticia Bianca. Quatorze anos e oito meses depois, em setembro de 2010, nasceu Tadeo Jasón.

Esses trinta anos não poderiam ser condensados aqui — merecem um capítulo à parte. Mas posso dizer que foram três décadas de uma vida normal, com tudo o que a vida traz. Até meados do ano passado.

Faltava uma semana para o Dia dos Pais — aqui se comemora no terceiro domingo de junho —, então era mais ou menos meados de junho. Acordei naquela manhã como qualquer outra, mas havia um chamado cravado na minha mente: eu precisava me reconectar com o pessoal de lá, com a Xuxa e suas Paquitas.

Atenção: eu nunca esqueci tudo o que aconteceu há mais de trinta anos, mas também não pensava nisso todos os dias. Tudo estava começando de novo, como naquele abril de 1991. Claro que não pensei em subir numa moto e viajar de novo ao Rio. Bem… pensei sim, mas é totalmente inviável hoje. Talvez um dia, mas não agora.

Comecei então, por meses, a buscar e recuperar fotos da época, e procurar na internet vídeos de gravações daquele tempo que eu nunca tinha visto, já que, vivendo na Argentina, nunca tive acesso aos programas da Globo. Quando me vi, e vi Marcelo naqueles segundos de programas de 1992, fiquei perplexo. Pensei em quantos eventos fortuitos precisaram se alinhar para que eu me encontrasse. Alguém precisou gravar em fita VHS na época, essa fita teve que sobreviver 20, 25 anos, alguém teve que digitalizá-la, depois subir para o YouTube… e no final, eu tropeçar nesses segundos entre milhares de horas de Xou da Xuxa. E ali estava eu.

Foi então que descobri que Xuxa lançaria no Brasil um documentário sobre ela. E pensei: tem alguém — ou muitas pessoas — lá relembrando tudo aquilo com nostalgia. Talvez eu tenha sentido essa energia fluindo de novo, quem sabe?

Contei para várias pessoas o que estava me acontecendo, mas sentia algo errado nisso. Era um monólogo. Então resolvi me reconectar com Marcelo, com quem não falava há 16 anos. Por quê? Porque com ele não seria um monólogo — seriam lembranças verdadeiras, porque ambos vivemos aquilo.

Então comecei a pensar como faria para reencontrar aquelas pessoas do Brasil. Os números que eu tinha eram fixos — certamente obsoletos. Os endereços também. Pensei nas redes sociais. Mas não sou fã. Prefiro falar pessoalmente do que mandar mensagem. Mas entendo a conveniência. E saber de tudo aquilo não significa que me lembrariam. Eu era só mais um rosto.

Não sentia que precisava reiniciar minhas viagens ao Rio — uma vida inteira passou. Era o desejo de reencontrar um velho amigo e dar um abraço, perguntar como está. Como o pai do filho pródigo — ou o filho pródigo voltando.

Depois de muitos vídeos no YouTube, entrei no Instagram e comecei a procurar por lá. Encontrei alguns grupos de fãs, e fui achando as Paquitas mais ativas: Xuxa, Leticia, Juliana, Bianca, Cátia, Ana Paula Almeida, Ana Paula Guimarães, Roberta, Priscilla… Mas não achava a Flávia.

Mandei mensagens para as duas Ana Paulas, nunca responderam, nem chegaram a ver. Minhas filhas me explicaram sobre privacidade nas redes. Leticia tem algo ativado onde só ela pode mandar mensagem. Priscilla precisa te aceitar para seguir. Faz sentido.

Até que conectei com uma Flávia, escrevi, e ela respondeu. Começamos a conversar. Três dias depois apareceu outra Flávia — essa sim era a verdadeira. A primeira era um fã-clube se passando por ela. A segunda respondeu e… lembrava desse viajante incansável! Foi um carinho na alma. Alguém se lembrar de mim depois de 30 anos… algo de bom eu devo ter feito.

Se passaram 32 anos da minha primeira foto com uma Paquita. Fiz uma história no Instagram sobre o “fio vermelho” do oriente — é incrível o comprimento desse fio se fosse físico, conectando dois pontos do espaço-tempo separados por 32 anos.

Pesquisando, vi no que cada uma se transformou. E o que era admiração pelo esforço e dedicação virou admiração pelas mulheres em que se tornaram.

Conversei com minha esposa Vilma — já havia falado sobre o que senti em 2023 e a reconexão com Marcelo. Mas agora contei sobre Flávia, e disse que me deu vontade de voltar ao Rio. Só vontade — nossa vida é simples. E nessa conversa, pedi perdão. Um pedido que demorei 30 anos para fazer. Aquele dia no Galeão, na nossa lua de mel, eu devia ter ido cumprimentar as Paquitas com ela, apresentar, levá-la a uma gravação. Mostrar esse mundo mágico do imaginário da Xuxa. Como não aconteceu, ela nunca viu com os próprios olhos.

E ela me respondeu: “Tenho um dinheiro guardado. Se você quiser ir ao Rio, vamos ao Rio.” Essa é minha esposa. Minha companheira de vida.

Agradeci, expliquei que não tenho necessidade urgente de ir, mas que um dia voltaremos. E citei aquela frase que virou realidade na minha vida:

“Tudo está tão magicamente unido que, se algo tiver que ser, você não poderá evitá-lo.”

Obrigado por usar seu tempo, leitor, para ler esta parte da minha história.

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