E se os atletas voltassem a competir nus nas Olimpíadas?

Reza a lenda da Grécia Antiga que, em 720 a.C., um atleta olímpico chamado Orsippus de Megara estava disputando a corrida de 185m quando sua tanga caiu. Em vez de parar para tapar suas partes íntimas, o homem continuou correndo e venceu a corrida. Seu exemplo triunfante pegou, e a nudez em competições atléticas virou a última moda na Grécia, vista como uma homenagem derradeira a Zeus.

Sarah Bond, professora de História na Universidade de Iowa, nos EUA diz que havia toda essa ideia de Orsippus ser heróico e vitorioso, e celebrar por ele estar nu. Para os gregos, ficar nu se tornou uma forma de reconhecer sua alma grega e civilidade.

No entanto, nas competições atléticas modernas, as roupas adquiriram um papel essencial no desempenho, os calçados, por exemplo, oferecem aderência e adicionam elasticidade à passada do corredor, os trajes de natação podem ajudar os nadadores a deslizar na água com mais facilidade e os uniformes justos podem reduzir a resistência ao vento.

Embora os competidores modernos costumem praticar seus esportes praticamente nus se levarmos em consideração que é basicamente uma lycra colada no corpo, certas peças de roupa têm finalidades primárias importantes, como manter os seios das mulheres e os órgãos genitais dos homens no lugar. Sem ser vulgar, isso ajuda em termos de conforto, pelo menos, segundo o diretor de projetos especiais, Shawn Deaton, do Centro de Proteção e Conforto Têxtil da Universidade Estadual da Carolina do Norte, nos EUA.

Em geral, no entanto, os trajes fazem algumas coisas pelos atletas. Tornam o corpo mais ágil e oferecem suporte, permitindo que a força dos músculos seja melhor direcionada para a tarefa em questão. Os cintos para levantamento de peso e as peças de lycra podem ser úteis, por exemplo, para estabilizar os músculos de um competidor para que ele possa direcionar toda a sua energia para o trabalho que está fazendo. Sem essas vestes, o desempenho pode ser prejudicado.

Roupas com a superfície bem lisa também podem reduzir a resistência que o corpo encontra ao se mover no ar ou na água, ou fora dela. Por exemplo, além de raspar as pernas, os ciclistas também podem se beneficiar do uso de roupas justas com resistência muito baixa ao ar e com rugosidades estrategicamente colocadas para melhorar a aerodinâmica. Mas o exemplo mais convincente das vantagens atléticas que os uniformes oferecem vem da natação. Na verdade, este esporte quase se tornou uma competição de engenharia, em vez de apenas das habilidades atléticas do corpo humano.

Outro acessório muito importante no esporte é o que o atleta leva em seus pés. Por questão de segurança, alguns esportes exigem calçados ainda mais especializados. Os mesmos reduzem o risco de escorregar e auxilia na estabilidade ao se pendurar na lateral do barco, por exemplo, além de melhorar o desempenho.

A engenheira industrial do Wilson College de Têxteis da Universidade Estadual da Carolina do Norte, Pamela McCauley diz que se os quiserem voltar a fazer as Olimpíadas nus, tudo bem, mas pelo menos mantenham os calçados.

Mas a nudez também pode influenciar em quem acaba competindo. Com ou sem sapato, alguns atletas talvez abandonem as Olimpíadas em protesto e as nações mais conservadoras podem proibir seus competidores de participar.

Para culturas nas quais o pudor desempenha um grande papel, isso simplesmente não seria contemplável. Haveria ainda sérias questões legais e éticas se os atletas menores de 18 anos também fossem obrigados a competir nus, ainda que houvessem atletas do sexo masculino de apenas 12 anos nus nos Jogos Olímpicos da Grécia Antiga. Mas lá, dada a natureza religiosa do evento, a atividade sexual ou sexualização dos atletas era estritamente proibida e seria muito mal vista, o que não seria o caso hoje.

Hoje, se tornaria inerentemente sexualizada e muito pornográfica, e isso se tornaria muito predatório, por sua vez. Além disso, na Grécia Antiga, algumas mulheres solteiras tinham permissão para assistiras as Olimpíadas, mas o público era majoritariamente masculino de elite, todos com a mesma formação cultural e religiosa. Hoje, por outro lado, os jogos são transmitidos para bilhões de pessoas em todo o mundo.

Enquanto os países conservadores provavelmente proibiriam os canais de transmitir os Jogos, em lugares mais liberais, as empresas de mídia enlouqueceriam de entusiasmo. As reações entre os telespectadores, por sua vez, seriam muito variadas, pois para cada pessoa que pensa que algo é artístico, nobre e glorioso, há outras que consideram repugnante.

As redes sociais garantiriam que todo o espectro de opiniões se espalhasse amplamente, quase certamente afetando o desempenho dos atletas cujos corpos estavam sendo analisados para o bem ou para o mal. Nisso, os mais desinibidos poderiam adorar a atenção, pois eles teriam esses corpos perfeitos e os exibiriam, já os competidores do sexo feminino e transgêneros enfrentariam mais julgamento do que os cis do sexo masculino.

Quando Brandi Chastain tirou a camisa após marcar o gol decisivo na Copa do Mundo Feminina de 1999, por exemplo, as fotos da jogadora de futebol de top geraram um frenesi na imprensa internacional, apesar do fato de atletas do sexo masculino, é claro, serem vistos sem camisa o tempo todo. Imagina o que aconteceria se os atletas ficassem completamente nus.

Se a nudez se tornasse um elemento permanente das Olimpíadas, poderia ser que, com o tempo, a sociedade voltasse à tradição grega de ver a nudez atlética pelas lentes do heroísmo e da celebração, mas isso certamente não aconteceria da noite para o dia.

Os vencedores dos primeiros Jogos Olímpicos de verão nus poderiam acabar não sendo aqueles com maior destreza atlética, mas aqueles com maior capacidade de canalizar a mentalidade grega antiga.

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